A abertura do "Ano da Fé" na
Arquidiocese de Vitória será na Catedral Metropolitana, na próxima quinta-feira,
dia 11 de outubro, às 19h, com Celebração presidida pelo Arcebispo
Metropolitano, dom Luiz Mancilha Vilela.
Sua Santidade, o Papa Bento XVI, decidiu proclamar um “Ano da Fé”. Começará no
dia 11 de outubro de 2012, no cinquentenário da abertura do Concílio Ecumênico
Vaticano II, e aniversário de vinte anos da publicação do Catecismo da Igreja
Católica, e terminará na Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do
Universo, no dia 24 de novembro de 2013. Nesse mesmo mês estaremos vivendo mais
um Sínodo dos Bispos, cujo tema será sobre a Nova Evangelização.
Todos nós, os católicos, devemos participar desse ano com “todo seu coração, com toda sua alma e com todo seu entendimento” (Mt 22,37). Mas qual é o sentido do Ano da Fé? A fé ainda tem espaço em nossa cultura secularizada? Em um mundo cheio de misérias, fome, guerras, onde Deus parece não ter lugar e nem vez, não seria uma alienação proclamar um Ano da Fé? Para que serve a fé?
Esses e outros
interrogantes são propostos aos cristãos. Respondê-los se faz necessário para
todos os que desejam viver sua fé com consciência, e não apenas como uma herança
de seus pais e avós esquecida e guardada em um canto perdido da própria vida, e
que não possui nenhuma incidência concreta no modo de viver, pensar, ser e
relacionar-se.
O cristão diante dessa problemática não se cala e nem
deve se calar. Devemos descobrir na oração os desígnios de Deus e dar respostas
adequadas. Gostaria de convidá-los a percorrer comigo um itinerário que nos leve
a descobrir o significado, importância e necessidade do Ano da Fé.
O Ano da Fé significa agradecer
O ser humano, em seu estado natural,
possui inteligência e vontade com potencialidades infinitas. A beleza que surge
das mãos dos homens é um reflexo da beleza que surge das mãos do Criador. No
entanto, não quis Deus que o homem permanecesse apenas em seu estado natural e
nos deu o dom da fé. O dom da fé e da graça eleva o homem ao estado
sobrenatural, somos filhos de Deus (1Jo 3,1). Neste estado podemos dizer com São
Paulo “Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim” (Gal 2,20). O estado
sobrenatural não está em conflito com o estado natural. A graça não destrói a
natureza, a supõe, eleva e aperfeiçoa.
A fé nos eleva a uma condição
superior, mas não de superioridade. É na vivência profunda da fé que o homem se
encontra completamente consigo mesmo e com o outro, e realiza plenamente a
vocação a que foi chamado.
Cristo é nosso Senhor e nos convida a
contemplar o mundo e seus irmãos com novos olhos. A fé, bem acolhida e
cultivada, nos oferece uma lente que permite perceber a realidade com o coração
de Deus. Por isto, o cristão não é indiferente aos assuntos do mundo. O
sofrimento e a dor que assolam a humanidade devem ser sentidos, sofridos e
compadecidos com maior intensidade por aqueles que se declaram apóstolos de
Cristo. É com o amor de Deus que amamos o mundo.
A fé não é alienação, ao
contrário, é trazer ao mundo um pouco do divino, é lapidar a beleza da criação
muitas vezes escondida pela nuvem do pecado. A verdadeira alienação é não
acolher, cultivar e promover o dom da fé. A busca de infinito que permeia o
coração humano encontra nela seu porto seguro, pois somente através desse
magnífico dom descobrimos quem realmente somos. Como dizia Santo Agostinho:
“Fizeste-me para Ti, Senhor, e o meu coração inquieto está enquanto não descansa
em Ti” (Confissões, l.1, n.1). Elevemos todos uma oração de agradecimento a Deus
pelo dom da Fé que nos enriquece, fazendo-nos mais humanos e filhos de Deus.
No Ano da Fé é necessário dar razões
São Pedro, em sua epístola, nos convida a dar razões de nossa esperança.
“Estai sempre prontos a responder para vossa defesa a todo aquele que vos pedir
a razão de vossa esperança, mas fazei-o com suavidade e respeito.” (1Pe.
3,15)
Não basta celebrar. A verdadeira ação de graças ao Senhor exige que
desenvolvamos o dom recebido. A fé é a resposta que o coração humano
naturalmente anseia encontrar. No entanto, o dom da fé não exclui a necessidade
de utilizar o dom da razão para compreender melhor os mistérios revelados por
Deus, de fazê-los compreensíveis e acessíveis ao homem em cada momento
histórico. Existe a inteligência da Fé que deve ser, unida à luz da graça,
desenvolvida a fim de que cada cristão possa aderir com maior liberdade às
verdades reveladas.
Só a partir de uma livre, consciente e renovada
adesão à própria fé haverá plena responsabilidade na vivência e testemunho desse
dom. É aqui onde dom e resposta, graça divina e liberdade humana devem se dar as
mãos para que a fé possa cair em terra fértil, semear e dar frutos em
abundância.
Esforcemo-nos por conhecer profundamente a fé que
professamos. Criemos grupos de estudos e reflexão, estudemos nossa
história.
Possuímos um instrumento maravilhosamente privilegiado para
esta finalidade: o Catecismo da Igreja Católica, que se apresenta também no
formato de compêndio e no formato para jovens, o YouCat, lançado na Jornada
Mundial da Juventude em Madri. Todos são fontes riquíssimas para alimentar nossa
alma e nossa inteligência. Temos também o Compêndio da Doutrina Social da
Igreja, os documentos do Concilio Vaticano II, as encíclicas papais e, acima de
tudo, a Sagrada Escritura.
Utilizemos as ferramentas que a sociedade
moderna nos oferece para nos atualizarmos, conhecermo-nos e encontrarmo-nos. É
louvável a iniciativa de diversos grupos de jovens que, na impossibilidade de
encontrar-se fisicamente com frequência, utilizam os bate-papos, os grupos que
as diversas mídias sociais oferecem. Desejo, vivamente, que estes grupos se
multipliquem. É importante que estejam guiados por uma pessoa ou que tenham um
moderador ou consultor com conhecimentos filosóficos e teológicos, que iluminem
e ajudem a entender melhor a própria fé.
Pelo batismo, somos, desde já,
cidadãos do Céu, mas devemos ser conscientes dessa tão alta dignidade. Não
devemos nos acanhar diante dos desafios que o mundo apresenta. A Igreja não
possui apenas dois mil anos de história, mas ela e, consequentemente cada um de
nós que estamos em comunhão com a Igreja, possuímos a assistência do Logos
Divino, da sabedoria eterna, que nos é dada através dos dons do Espírito Santo.
Não devemos ter medo de dialogar com o mundo contemporâneo. É nossa missão
evangelizar a cultura. Como afirma Bento XVI, "a Igreja nunca teve medo de
mostrar que não é possível haver qualquer conflito entre fé e ciência autêntica,
porque ambas, embora por caminhos diferentes, tendem para a verdade."(Porta
Fidei, n. 12). Sejamos os promotores da Verdade na caridade, e da caridade na
Verdade.
No Ano da Fé é importante proclamar
Bento XVI, com muita sabedoria, alerta que muitos cristãos sentem "maior preocupação com as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária." (Porta Fidei,2) Diante dos desafios que nos apresentam a sociedade secularizada, nossa primeira reação é lançar-nos a fazer algo. Desejamos, justificadamente, e nos esforçamos, com boas intenções, por unir pessoas, grupos e entidades para combater aquilo que consideramos como nocivo ao cristianismo e à humanidade.
Considero importantes todas as iniciativas que visam promover nossa fé e
incidir positivamente na sociedade e que contenham o avanço do mal que se
alastra em nossa cultura. Mas, o que seriam dessas iniciativas de luta e de
força, de combate e embate sem a fé? Não vejo os primeiros cristãos se
conjurando para dominar as instituições através da força e do poder. A ação mais
importante e fecunda de nossos primeiros irmãos foi, a partir de experiência que
nasce do encontro pessoal com Cristo, testemunhar com a própria vida que Deus
existe. Os pagãos se sentiam atraídos pela beleza da fé católica e pela caridade
com que viviam os primeiros cristãos, e chegavam a exclamar: “Vede como se amam”
(Tertuliano, Apol.,39).
É na caridade, na alegria, no entusiasmo e na
felicidade da vivência de nossa fé que iremos permear o mundo da esperança e do
amor cristão. É no respeito, no diálogo aberto, sincero e inteligente que
construiremos pontes entre a Fé e o mundo contemporâneo. Já existem muitos
muros!
Aprendamos a difícil arte de escutar, entender, compreender e
defender sem medo nossa fé, com serenidade e respeito.
A evangelização e
nossas ações sociais só produzirão efeito a partir do momento em que cada
cristão tiver um encontro pessoal com Cristo.
Nossa fé não é fruto de
uma decisão, mas de um encontro, e só a partir desse encontro nossa
evangelização será uma luz que atrai por sua beleza divina.
Onde se
realiza esse encontro? Não se é cristão sozinho. O ser humano é um ser social
por natureza. É na comunidade de fé e na Igreja, como custódia dos sacramentos
de Cristo, que encontraremos, renovaremos e promoveremos nossa fé. Só podemos
nos dizer plenamente cristãos se encontrarmos nossos irmãos na oração, na
eucaristia e na reconciliação.
Sem comunidade não há família cristã. É
através do mistério do Corpo Místico de Cristo onde toda a Igreja se encontra. É
na liturgia e nos sacramentos que toda ação tem sentido. "Sem a liturgia e os
sacramentos, a profissão de fé não seria eficaz, porque faltaria a graça que
sustenta o testemunho dos cristãos." (Porta Fidei, n.11)
É na vivência
comunitária de nossa Fé que encontramos o amor de Cristo. «Caritas Christi urget
nos – o amor de Cristo nos impele» (2 Cor 5, 14). Sua Santidade afirma que “é o
amor de Cristo que enche os nossos corações e nos impele a evangelizar. Hoje,
como outrora, Ele envia-nos pelas estradas do mundo para proclamar o seu
Evangelho a todos os povos da terra (cf. Mt 28, 19).” (Porta Fidei,
n.7)
O amor de Deus cria! A palavra criação possui a mesma raiz grega da
palavra poesia “poietés”. Assim, Deus é o verdadeiro poeta e nós somos um poema
de Deus. Por isso, é impossível não ficar admirando, contemplando o sol que
nasce no horizonte, ou a lua cheia que cresce por trás dos montes. A natureza
são versos divinos que nos remetem a Deus. Aqui, em nossa cidade maravilhosa,
temos o momento e local para aplaudir o pôr do sol. No entanto, afirmo que não
há maior milagre e poesia mais bela do que o olhar e o sorriso de um cristão que
vive no mundo com coerência, simplicidade e entusiasmo a sua fé.
O
católico tocado pela fé é uma das provas e evidências mais fortes da existência
de Deus. Quando conheço um cristão coerente, vejo um milagre da criação. Vejo
Deus na Terra e percebo que não há trevas que possam invadir um mundo dominado
pela luz da fé, pelo sal do testemunho e pelo bálsamo da caridade. Em cada um de
nós, de certo modo, se realizam de maneira plena as palavras de Cristo: “Eu
estarei convosco todos os dias, até o fim dos tempos (Mt 28,20).
Peçamos
a Nosso Senhor Jesus Cristo a graça de viver nossa fé com toda nossa alma, com
todo nosso coração e com todo nosso entendimento. Só assim seremos o que temos
de ser e transformaremos o mundo. Só em Cristo, por Cristo e com Cristo
conseguiremos transmitir os tesouros de nossa fé e incidir positiva e
efetivamente na sociedade. Não tenhamos medo de falar daquilo que preenche nosso
coração; não tenhamos medo de falar d'Aquele que dá um sentido último às nossas
vidas. Subamos nos telhados e nos preparemos para anunciar com amor que o Amor
existe, se fez carne e habita em nós e está entre nós.
Preparemo-nos,
através da oração, da adoração, da eucaristia, da reconciliação e da missão
pessoal e comunitária para o Ano da Fé, que coincidirá, para o nosso júbilo, com
a preparação e a realização da JMJ Rio 2013!
Conforme orienta o Papa, “será um
momento de graça e compromisso para uma plena conversão a Deus, para fortalecer
a nossa fé n'Ele e a anunciá-Lo com alegria ao homem do nosso tempo”.
Ao longo deste período, diversas
iniciativas serão realizadas nas paróquias e nas comunidades, para aprofundar a
fé e impulsionar a alegria de testemunhar o Cristo ressuscitado.
Participe deste momento
celebrativo na Arquidiocese de Vitória.
AVES - Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo
Dom Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ